Critica de Marcus Lontra Publicada no correio Brasiliense

A Gravura como exercício de sedução

“Arnaldo Battaglini une a simplicidade ao exercício da beleza gravuras que expõe na Galeria Itaú”

De tempos em tempos surge uma teoria ou mesmo um movimento que assegura a morte de arte. E o que vemos é que, passada a euforia da novidade, as técnicas tradicionais de manifestação artísticas permanecem vivas e despertando interesse.
Os anos 80 assinalaram o retorno das relações entre as práticas artesianas e as elaborações de ordem conceitual. Isso permitiu o retorno da pintura e da gravura ao centro das discussões, opção corajosa, ponte a ligar o passado e o presente.
Mas, se a pintura vem sendo incensada pelos meios de comunicação e principalmente pelo mercado de arte, a gravura parece esquecida. A verdade é que, apesar do pouco investimento comercial a ela dedicado, a gravura continua a despertar a atenção de vários artistas que a ela se dedicam reelaborando seus discursos estéticos através do instrumental que acompanha a vida do homem sobre a terra há mais de 500 anos.
A mostra de Arnaldo Battaglini, na Galeria Itaú, é um dos mais eloquentes exemplos da vitalidade da gravura em metal brasileira. Paulista, 36 anos, ele estudou em Londres e desenvolve atividades didáticas em São Paulo com desenho e pintura, porém é na gravura que o artista vê a síntese de sua ação; as pequenas formas, linhas e planos, harmonizam-se nos silenciosos espaços de sua obra. Há na verdade, clareza de método, uma evidência na pesquisa que parece de chapas recortadas que armam no espaço oferecido pelo suporte em permanente diálogo com a linha tradicional criada através da impressão com arame, técnica não tradicional, que vem permitindo ao artista obter resultado de valor estético.
Arnaldo determina o seu repertório formal que vai encontrar origens nas colagens de Matisse, na sensualidade das curvas das áreas chapadas, ao mesmo tempo que acrescenta formas orgânicas, elaboradas de maneira simples, direta e contundente. A figura humana está presente, seja em evidência ou por sugestão. Em alguns casos o artista a trabalha pelo contorno das linhas, sintetizando as pesquisas que relacionam o gráfico e a cor, a inteligência e a sensibilidade. Trata-se de um artista de com um perfeito domínio de técnica : isso, no entanto, não o transforma num virtuoso – perigo onde tombam vários artistas gravadores.
Arnaldo trabalha tendo por meta a simplicidade e a clareza sem perder em nenhum momento uma certa elegância, um investimento na arte como exercício de sedução e de beleza.
O caráter intimista da técnica reforçado pela opção do artista. Aqui não há espaço para a vibração expressionista, esse não é o mundo da multidão, da gritaria, o artista afirma que a inteligência caminha paralela à clareza; a obra de Arnaldo é um exercício que pesquisa relações de arte harmônicas, em concórdia com a vida. A relação figurativa estabelece–se a partir de uma espécies de otimismo humanista que aflora na sua produção. Arnaldo parece acreditar que apesar de tudo ainda há uma esperança, ainda haverá futuro. Nada mais natural portanto que ele não mergulhe no universo tenso e desesperado da crise da arte nesta virada de século ao mesmo tempo que recuse a esterilidade fria e já convencional da geometria. Há, além de tudo mais: a essência da arte de Arnaldo Battaglini evidencia a sua disposição em unir a tradição objetiva da modernidade com aspectos da fantasia, da criação e da subjetividade. A arte, enfim só se explica e justifica para o mundo enquanto ela for um instrumento de libertação, enquanto for um exercício permanente da dúvida, enquanto uma revelação. Mário Pedrosa já nos ensinou que “de nada adiantará a revolução econômica e social se ela não vier acompanhada da revolução da sensibilidade”.